Resumo Sorrisos Meio Sacanas - Sérgio da Costa Ramos
Resumo do Livro Sorrisos Meio Sacanas de Sérgio da Costa Ramos.
Sorrisos Meio Sacanas - Sérgio da Costa Ramos
Vida
Ficcionista, sensível ao lado crítico da vida, e sabe explorá-lo com arte e sentimento da realidade. Sérgio da Costa Ramos é escritor e jornalista, nascido em Florianópolis no mês de agosto de 1947, filho do também jornalista Rubens de Arruda Ramos e Gessen da Costa Ramos. Sérgio tem quatro irmãos homens, sendo que deles, Paulo da Costa Ramos também é escritor. Casado pela segunda vez com Carmem, com a qual vive atualmente, tem uma única filha do primeiro casamento, Isabela, com doze anos.
Sua primeira obra foi publicada em 1976 em uma coletânea de autores catarinenses.
Obras
- Cambada de Mentiroso (Lunardelli, 1987)
- Os Civis Precisam Voltar aos Quartéis, crônica (Editora da UFSC, 1986)
- A Emulsão de Ulysses, crônicas (Editora Global, 1988)
- Enfermaria Brasil, crônicas (Editora L & PM, 1993)
- Os Previdenciáveis (Editora Francisco Alves, 1994)
- O Rap do Real, crônicas (Mapa Markenting/ Estúdio 4 Editora, 1995)
O seu último livro, Sorrisos Meio Sacanas, reúne uma coletânea de 56 crônicas. A maioria delas foram publicadas ao longo dos últimos dois anos na coluna mantida pelo cronista, no Diário Catarinense.
Ele se inspira nas críticas e nos acontecimentos do dia-a-dia.
Considerações Gerais
Sorrisos Meio Sacanas reúne as melhores crônicas de Sérgio da Costa Ramos (catarinense e ilhéu), publicadas em jornais e revistas - este é o quinto.
Comentário sobre a obra (escrito por Adolfo Boos Junior)
(...) A matéria prima de Sérgio da Costa Ramos é o sorriso de deboche ou conformado, de alegrias cada vez mais raras, ou o sorriso existencial e melancólico, de profundas tristezas, de teimosas esperanças ou descrenças mais e mais amargas. Contudo, jamais a gargalhada. Sempre o sorriso, sempre chapliniano (a la Charles Chaplin)
Resumo
São seis conjuntos de crônicas. Cada conjunto tem um título geral, classificando as crônicas de acordo com o seu tom, ou seja a temática, o sentimento do autor em relação ao assunto abordado.
Títulos Gerais
- Meio Sacanas
- Amargos
- Da Desforra Inútil
- Ainda Cândidos
- Nativos (Mané)
- D'Além Mar
Em Meio Sacanas, como o nome já diz, fica evidente um certo deboche.
Exemplo:
Departamento de Sacanagens: (...) Os comitês andam excitados diante da proximidade do veredicto de novembro, e por isso trabalham febrilmente os Departamentos de Sacanagens , Boatos, Difamações e Baixarias em Geral, todos tendo por alvo o candidato líder das pesquisas. (...)
(...) Então vamos dizer que o homem fuma maconha! É um viciado!
- Que é isso, rapaz! E perder os votos da Turma da Esquadrilha? Como é que você acha que o Gabeira foi eleito?
...
- Que o homem é "pedófilo" , pô!
- Não adianta! Os manés iam pensar que ele gosta de andar di a pé...
...
- Vamos dizer que o nosso candidato fala com Deus!!!
- Bem, aí, difícil mesmo vai ser marcar uma audiência. No momento, o FHC só fala em reeleição!
Em Sorrisos Amargos, o cronista fala da guerra, da bomba atômica e até da escassez de peixes no mar que circunda a Ilha.
Exemplo:
A Deus: O cronista escreve uma carta a Deus reclamando da "convocação" de Tom Jobim e outros brasileiros ilustres, como Airton Senna, Raul Seixas, Elis Regina...
Para compensar, pede uma indenização: vida longa aos sabiás da Ilha - os pássaros e os cantores.
Em Sorrisos da Desforra Inútil, há o traço da indignação. Os temas são a política (o lado sujo e hipócrita), o caso do Banco Econômico e outros.
Irmãos de Cruz: Um exemplo estás em A humilhante fila de clientes micados do Econômico coleia pela rua Tenente Silveira, pelo segundo dia de atroz espera e agonia. (...) Por um desses insondáveis mistérios do tempo, Cruz e Souza está ali, sofrido e solidário com sua gente. (...) Contempla a dor organizada e conformista dos irmãos injustiçados pela satânica cupidez dos ladrões de casaca.
Paira então sobre o iluminado poeta uma ira santa, uma ira bíblica.
Improvisa um púlpito, um caixote, recita "Mendigos".
Mendigos! Ah! São mendigos
Que voltam de vãos caminhos
Que atravessaram perigos,
Urzes, pântanos, espinhos.
Que chegam desiludidos
Das portas onde bateram:
Humanos, grandes gemidos
Que nos tempos se perderam.
Terá algum dia Ângelo Calmon de Sá, o anticristo, lido um soneto, um único verso de poesia?
Poeta (Cruz e Sousa) que morreu nas Gerais, num sanatório, tentando se curar da tísica - e cujo corpo, gélido e solitário, chegou ao Rio de Janeiro em vagão de carga, num esquife indigente e sobre um tapete de feno. (...)
Em Sorrisos Ainda Cândidos, o tom é doce, comovente, às vezes até singelo como em:
Três Ofícios: O cronista fala de três profissões modestas, anônimas, mas de grande valor: O carteiro Deus te abençõe, amigo carteiro! Quanta emoção trazes escrita, quantos suspiros esgarranchados em caneta BIC!
O lixeiro... És imaculado, puro, impoluto por dentro, amigo lixeiro. De tua alma evola um cheiro bom, que nada tem a ver com os miasmas putrefatos dos depósitos a céu aberto. És útil, bem mais útil que o Doutor, o assessor, o senador, o presidente da República. És o rei da infame profissão, mas como é util, como é prestativo o teu ofício!
O sapateiro... Devíamos todos render nosso sincero tributo a este valente artesão que ajuda a humanidade a caminhar.
Especialmente nesses dias de dura carestia, em que um par de sapatos jamais será desprezado antes de tantas meia-solas quantas comporte a carroceria.
Em Sorrisos Nativos (mané), o assunto são as coisas da Ilha, a pesca da tainha e por aí vai...
Exemplo:
Encontro com Machado: Encontrei Machado de Assis, de terno, colete e cartola, fumando um cigarrinho na esquina da Conselheiro Mafra com Trajano ( ruas do centro de Florianópolis. (...)
...
- E a que vieste? - pergunto com a boz baixa e modulada, de sorte a não espantar o visitante.
- Personagens. Busco tipos de cidades pequenas, ainda não ensandecidas pela bovina pasteurização das grandes metrópoles. (...) Há bons tipos por aqui?
Em Sorrisos D´Além Mar, Sérgio narra a generosidade lisboeta e o privilégio de ouvir o português original, o mais catitiço do planeta, embora não necessariamente o mais inteligível, à foz do rio Tejo, de onde tudo começou, inclusive o Brasil.
Antologia
Texto I
A Relíquia
Desço a rua Trajano, surpreendentemente franqueada por casarões azulejados, alcanço a Conselheiro Mafra na altura do Largo da Alfândega, diviso o renque de janelas e telhados limosos, fachadas de meias-portas e portões que olham passar o tempo.
Subo essa Deodoro, até a Igreja de São Francisco. Mais telhados esverdeados pelo tempo. Essa Florianópolis antiga se parece também com Laguna, com São Francisco do Sul. Estranho. Nesta sincrética cidade luso-brasileira ponteiam ruas e ruelas de nomes pitorescos, sonantes, encantadores. Nada de nomes próprios de figurões, homenageados pelos puxa-sacos. Nada de nomes conjugados apenas pela declinação do elogio fácil de alguma lei municipal. Não. São nomes simples, espontâneos, ditados pela alma do povo: Rua da Alegria, Travessa da Glória, Rua da Santa Justa, Rua dos Fanqueiros, Rua dos Cordeiros, Rua do Salitre, Travessa do Quebra-Pentes, Rua dos Arameiros, dos Bacalhoeiros, Beco do Arco Escuro. Lisboa, bela e comovedora cápsula do tempo, ela mesma sítio e personagem de A Relíquia, do mestre Eça: "Acende em mim o deleite de rever, sob o céu de janeiro, tão azul e tão fino, a minha Lisboa com as suas quietas ruas cor de caliça suja, e aqui e além das tabuinhas verdes descidas nas janelas, como pálpebras pesadas de langor e de sono."
Sono e langor são sensações raras nessa Lisboa em obras, embora atenta sentinela de sua própia memória. Os bares em volta do Rossio estão vivos e bem despertos. Há mesmo uma briga entre benfiquistas e belenensistas na bodega chamada "Tendinha" - esquina da velha Praça com a rua Augusta. Discutem o 1x1 que acabara de se produzir no estádio do Restelo. Torcedor é igual em qualquer parte do mundo. Não se entendem. Logo sai briga:
- Aldrabão!
- Batoleiro!
- Besuntão!
- Tua equipe é uma falhança!
Aldrabão é vigarista. Batoleiro, claro, é trapaceiro.
Besuntão - fico sabendo - é "porcalhão". Falhança é fiasco.
Traduzida a discussão, dá-se a perspectiva de paz quando os litigantes passam em frente da "Ginjinha" - o botequim que vende um alicorado de frutas, muito apreciado na terrinha.
Na porta, lê-se a trova que convida o passante:
O Matheus é um chóquinha
Mais frio que camafeu
Magro, tísico, um fuínha
Nunca na vida bebeu,
Nem um copo de Ginjinha.
O irmão que sabe a virtude
D'esta divina ambrosia
É gordo como um almude,
bebe seis copos por dia,
Por isso goza tanta saúde.
Mais um pouco e me transformo em personagem e entro n'Os Maias de Eça de Queirós, confraternizando com João da Ega e Palma Cavalão.
Texto II
Portuguesal
A língua portuguesa é sempre uma pândega. Em Portugal, então, chega a ser um espetáculo de histrionismo contínuo. Para falar, cada português estaria no seu direito se resolvesse cobrar ingresso do seu interlocutor.
É vezo bem lusitano desprezar barbarismos brasileiros para designar novos substantivos de uso corrente na vida cotidiana. Bastam os velhos e confiáveis radicais das suas próprias palavras-mãe.
Um posto, por exemplo. Em português luso poderá ser "emprego", "posto de trabalho". Qualquer coisa, menos posto de gasolina.
Posto de gasolina chama-se gasóleo.
E frentista? Não existe. Que horror. Coisa de brasileiro.
Frentista lá é gasolineiro.
Pode ser engraçado, mas tem sua lógica. Como sorvete, outro barbarismo jamais admitido na flor do Lácio à beira-mar plantada. Raiz turca de serbet, que virou sorbétto na Itália e sorbet na França, chegando, por macaquismo e metaplasmo, ao nosso sorvete, em 1858.
Em Portugal, é gelado.
E sorveteria é geladaria.
Temos aqui, portanto, geladarias famosas como a Kibon.
Engraçado que, partindo da língua de Shakespeare, eles aceitam e naturalizam os mais estranhos anglicismos, o que não seria de revelar um certo masoquismo de povo colonizado.
Um amigo pagava em Lisboa sua dolorosa num restaurante no Rossio. O garçom, fazendo as contas num smoking condecorado por divisas de almirante batavo, perguntou ao meu amigo se ele havia tomado alguma "espirituosa".
Não, não era uma piada. Era "espirituosa" de spirits, destilados em inglês.
Utilizando esta lógica portuguesa de produzir filhotes a partir de seus substantivos-mãe, divirto-me com o resultado, que é verdadeiro, e não inventado.
Como se chamará o lugar onde vivem os morcegos, ou aquilo que a eles se refira? Morcegal, é claro.
E um parreiral? Será uma seqüência de videiras, ou de cabeças-de-área, bem ao gosto do Parreira?
E qual será o adjetivo de jumento? Jumental, é claro.
Mas a regra não é só acrescentar vários al por aí.. O de galinha não é galinhal, mas sim aquilo que muitos goleiros não rejeitam numa tarde de domingo: um galináceo.
O de ostra é ostráceo. O de ovelha, ovina. O de tigre, tigrino. O de peru, perueiro.
E o de veado (êpa!): cerval ou cervino. Mas bem que poderia ser viada.