Resumo Os Melhores Sonetos - Luís Vaz de Camões

Resumo do Livro Os Melhores Sonetos de Luís Vaz de Camões.

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Resumo Os Melhores Sonetos - Luís Vaz de Camões
Os Melhores Sonetos

Os Melhores Sonetos - Luís Vaz de Camões

  • O MITO
    A biografia e a bibliografia de Luis Vaz de Camões levantam problemas apaixonantes e aparentemente insolúveis, quer pela distância temporal, quer pela falta de dados confiáveis, quer pela grandiosidade com que a obra e o tempo foram construindo, não uma reputação, mas um verdadeiro mito dentro da literatura portuguesa e universal. Nascido provavelmente em Lisboa, em ano incerto e não sabido, filho de uma família da pequena nobreza, não se pode aceitar que não tenha tido uma educação formal de qualidade, tendo a vista a universalidade do conhecimento que ressuma de sua obra, particularmente da épica. Na juventude freqüentou a corte e a boêmia lisboeta, onde o gênio forte e aventureiro o marcaram e conseguiram o cognome de "o trinca-ferros" com que passou a ser conhecido. Envolvido em repetidas brigas e confusões, acabou embarcado para o serviço militar
    nas índias - Portugal então estava empenhado na expansão ultramarina - e passou cerca de vinte e cinco anos longe da pátria, chorando o "exílio amargo e o gênio sem ventura”.
    Retornando à pátria, por obra e graça do acaso e da ajuda de amigos, pôde publicar sua obra máxima, quiçá o maior monumento literário das literaturas lusófonas - Os Lusíadas - que por si só vale pôr uma literatura inteira.

    • A LÍRICA CANIONIANA
    A lírica de Camões compreende duas vertentes principais:
    - A tradicional constituída de redondilhas que vão compor vilancetes, motes glosados, cantigas e trovas todas bem representativas da chamada "medida velha", tão em voga na literatura portuguesa medieval.
    - A clássica em que avulta a soneto petrarquiano, do qual é o grande e insuperável mestre de uma linhagem de maravilhosos sonetistas que enriqueceram as letras lusitanas através do tempo.

    O soneto camoniano é incomparável na técnica superior, no domínio abastado do vernáculo, na felicidade da escolha dos temas, na sensibilidade das imagens criadas. Dessa forma, o campo de observação do estudioso é visto, rico e diversificado. As camadas ática, fônica, semântica e morfossintática interpenetram-se de maneira admirável, revelando um Autor ciente de seu oficio e dotado de talento superior para bem executa-lo, unindo, em suas próprias palavras, "engenho e arte" na construção de verdadeiras jóias literárias.
    Humanista notável, soube exprimir a experiência vivida na guerra e no exílio, na prisão e na miséria, no amor e no abandono, na presença e na saudade. Sua poesia revela a meditação profunda sobre a realidade circundante, à luz de uma sólida cultura teórica que embasou o desvelamento de seu universo mítico solidamente plantado na cultura renascentista clássica e classicizante de que fazia parte.
    A lírica camoniana é contaminada pelo cânone maneirista, lembrando em muitos casos o Barroco literário que viria a seguir. Sua exploração da dúvida existencial, do desconcerto do mundo, a inquietude entre a come e o espírito, as contradições do amor, sempre de forma equilibrada, harmônica e formalmente inatacável, revelam um homem atento ao que o cercava, mas com inquietação suficiente para ir além e antecipar; prever e meditar; inovar e surpreender. Nos sonetos é que Camões exercitou todas as suas virtualidades, aproveitando-se da brevidade e da estrutura facilitadora dos exercícios engenhosos da exploração das mais raras figuras e significados. As contradições do amor, o universalismo do homem renascentista; o neoplatonismo; o amar e o querer são temas versados com raras maestria e beleza.

    (l)
    Amor é lago que arde sem se ver;
    ferida que dói e não se sente;
    E um contentamento descontente;
    É dor que desatina sem doer.
    É um não querer mais que bem querer;
    É um andar solitário por entre a gente;
    É um nunca contentar-se de contente;
    É um cuidar que se ganha em se perder.
    É querer estar preso por vontade;
    É servir a quem vence; o vencedor;
    É ter com quem nos mata lealdade.
    Mas como causar pode seu favor
    Nós corações humanos amizade,
    Se do contrário a si é o mesmo amor?
    Conceituando a natureza paradoxal do amor; o soneto ressalta, em enunciados antitéticos, compondo um todo lógico, o caráter paradoxal do sentimento amoroso. Esclareça-se, entretanto, que tais contradições são, por vezes, aparentes, pois a segunda pane de cada verso funciona como complemento da primeira, enfatizando-a por intermédio da aproximação de realidades distintas, quais sejam o aspecto material, sensível (ferida que dói) (é dor que desatina) oposto ao transcendental e espiritual (em que se sente) (sem doer) como, de resto pode-se observar ao longo de todo o soneto, culminando com a indagação final, a traduzir toda a perplexidade diante da total impossibilidade de se compreender o próprio amor. 

    Sete anos de pastor Jacó servia
    Labão, pai de Raquel, semana bela;
    Mas não servia ao pai, servia a ela,
    Quer a ela só por prêmio pretendia.
    E os dias na esperança de um sò dia
    Passava, contentando-se com vê-la;
    Porém o pai, usando de cautela,
    Em lugar de Raquel lhe dava Lia.
    Vendo o triste pastor que com enganos,
    Lhe fora assim negada a sua pastora,
    Como se a não tivera merecida;
    Começa de servir outros sete anos,
    Dizendo: - mais servira, se não fora
    Para do longo amor tão curta a vida.
    A matéria prima do soneto vem diretamente do Antigo Testamento - Gênesis, XXIX, 25, - em que se narra uma das mais belas histórias de amor de toda a literatura universal: o amor de Jacó por Raquel. laco serviu a seu tio, Labão, por sete longos anos para fazer jús a Raquel, filha mais nova e linda. Após cumprir sua parte do acordo, recebe Lia, a filha mais velha, de bem poucos atrativos. Do impasse, Jacó inicia uma nova servidão de sete anos para conseguir sua amada. Raquel. Percebe-se a grandeza do amor de Jacó, que não serviria só mais sete anos, mas sete vezes setenta e sete, desde que conseguisse o objetivo almejado.
    Ressalta aqui o grande poder de síntese de nosso vate que resume todo um episódio bíblico nos limites estreitos de quatorze versos, com grande maestria lingüistica e interpretativa e sem que se perca nada do conteúdo primitivo e ainda acrescentando a carga poética bem mais densa e significativa que o original de onde foi extraida.
    Ressalte-se, ainda, a grande economia de meios. Nada de vocabulário erudito ou hermético. Usando os termos em sua denotação usual e sem apelar em demasia para a figuração, o poeta passa a mensagem que pretende de forma absolutamente lógica e coerente, numa linguagem arrumada, seqüenciada e expressiva de tal forma que instaura uma linha direta de entendimento entre os homens de diferentes épocas, materializando magistralmente a função sinfrônica de que o texto literário de alto nível sempre é portador.

    (3)
    Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
    Muda-se o ser, muda-se a confiança;
    Todo o mundo é composto de mudança,
    Tomando sempre novas qualidades.
    continuamente vemos novidades,
    Diferentes em tudo da esperança;
    Do mal ficam as mágoas na lembrança,
    E do bem, se algum houve, as saudaales.
    O tempo cobre o chão de verde manto,
    Que já coberto foi de neve fria,
    E em mim converte em choro o doce canto.
    E, afora este mudar-se cada dia,
    Outra mudança faz de alor espanto:
    Que indo se muda já como sota.
    O soneto retoma a Teoria do Devir, do filósofo Heráclito, "O que é, enquanto é, não é, porque muda", que reconhece como sendo a mudança o único estado observável das coisas. Essa colocação do tema da efemeridade da vida, e da continua mudança de. todas as coisas, é realçada pelos pares antitéticos mal x bem, verde manto x neve fria, choro x doce canto. O estado de incerteza contamina a própria mudança que não se faz mais como se fazia. Abre-se outro par antitético: presente x passado.
    O tom pessimista fica evidente com a alusão de que a mudança acontece sempre para pior, instaurando-se, ai, o saudosismo desesperançado tão presente no sentimento português de todos os tempos.

    (4)
    Quando da bela vista e doce riso,
    tonando estrio meus olhos mantimento,1
    tão enlevado sinta o pensamento
    que me faz ver na terra o Paraíso.
    Tanto do bem humano estou diviso,2
    que qualquer outro bem julgo por vento;
    assim, que em caso tal, segundo sento,3
    assaz de pouco faz quem perde o siso.
    Em vos louvar, Senhora, rido me findo,4
    porque quente vossas cousas claro sente,
    sentirá que não pode merece-las.
    Que de tanta estranheza sois ao mundo,
    que não é d'estranhar, Dama excelente,
    que quem vos fez, fizesse Céu e estrelas.
    1 Tomando mantimento - tomando consciência.
    2 Estou diviso - estou separado, apartado.
    3 Sento - sinto.
    4 Não me fundo - não me empenho.
    Um soneto que caracteriza à saciedade o vínculo de Camões com a lírica neoplatônica e petrarquista. Assimilando, como todo cristão culto de sua época, o idealismo de Platão, reorientado na Idade Média pelos doutores da Igreja - Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino -, Camões concebe a mulher não como uma companheira humana, mas como um ser angélico que sublima e apura a alma do amante, Iluminada por uma luz sobrenatural que lhe transfigura as feições carnais, a beleza feminina convertesse numa imitação da Beleza plena, pura, que leva ao "mundo das idéias" e à divindade. É o que fica patente na "chave de ouro" do soneto em questão, que, apontando a distância entre a "Senhora" e as coisas terrenas, contemplada expressamente como criatura divina; "... não é d'estranhar, Dama excelente, que quem vos fez, fizesse Céu e estrelas... "
    Já no primeiro quarteto, a "bela vista e doce riso" são atributos que permitem ao poeta vislumbrar o Paraíso. E essa visão é tão perturbadora que, como registro o quarteto seguinte, seria causa de uma quase loucura: "assaz de pouco faz quem perde o piso". Observe-se o contraste entre a dimensão humana do poeta, tenso e contraditório, e a imagem feminina, imaterial, distante e serena.
    A forma fixa do soneto petrarquista, pela disposição estrófica em dois quartetos e dois tercetos, e a métrica decassilábica (a "medida nova") são os dois traços mais evidentes da Escola Clássica, imediatamente perceptíveis. Mas há mais: a sintaxe opulenta, com hipérbatos freqüentes, a seleção vocabular, a contenção emocional, o desenvolvimento lógico..,

    • CONCLUINDO

    Camões é considerado o maior poeta da língua portuguesa, entre todos. Sua lírica, dividida em poesia tradicional (medida velha) e no que se convencionou chamar de "medida nova", vazada em versos decassílabos e explorando a forma fixa do soneto, aborda os mais
    variados. temas representativos da cosmovisão do mundo renascentista, como o amor; o desconcerto do mundo; a efemeridade da existência; o neoplatonismo e a fusão do maravilhoso cristão com o pagão, numa clara antecipação do Barroco que viria a seguir.
    Como elementos formais destacam-se o tom elevado, o vocabulário medido e contido, a harmonia simétrico das construções e a grande expressividade conseguida com imagens que falam bem alto à sensibilidade, sem descambar para o hermetismo ou para a ostentação intelectual.
    SERVIÇO
    "CAMÕES - OS MELHORES SONETOS" é obra
    com leitura integral recomendada aos candidatos
    ao vestibular da FUVEST.
    FONTE
    Resumo feito pelo professo Honneur Monção
    da cadeia de Português do Colégio Objetivo Brasília
    BIBLIOGRAFIA
    . Azevedo Filho, Leodagário A. Luis de
    Camões - os melhores Poemas - Seleção.
    São Paulo - SP Global Editora 1998.
    . Moisés, Maswul. Lírica de Luís de Camões.
    São Paulo - SP Cultural 1984.
    . Nicola, José de. Literatura Portuguesa
    São Paulo-SP Editora Scipione, 1994.
    . Proença Filho, Domício. Estilos de Época em
    Literatura. São Paulo-SP Ed. Leu 1969.